Racismo ambiental no Brasil e as tragédias climáticas

As irmãs Ana Vitória e Thaline Cordeiro, de 7 e 16 anos, foram duas das vítimas dos deslizamentos em São Sebastião, a região mais atingida pela tempestade em fevereiro deste ano, que deixou mais de 60 mortos e 4 mil desabrigados no litoral norte paulista. Mais uma vez as fortes chuvas de verão – cada vez mais intensas com a crise climática – escancararam as desigualdades e o racismo ambiental.

Esse termo se justifica porque a maioria dos brasileiros que vivem em comunidades sem infraestrutura habitacional são pessoas pretas ou pardas, conforme informativo do IBGE publicado em 2022. As estatísticas explicam por que Ana Vitória e Thaline, que perderam a vida tão cedo numa tragédia natural, eram negras.

Em São Sebastião, a maior chuva da história atingiu igualmente a Vila e a Barra do Sahy. A primeira localidade era onde estavam as irmãs; a segunda, concentrava condomínios de luxo. No entanto, as condições precárias de moradia, em área de alto risco de desmoronamento, acabaram por concentrar todas as vítimas do lado mais pobre. Já na parte oposta, veranistas usaram até helicópteros para deixar a região.

A justiça climática não engloba o racismo ambiental

A militante da Uneafro Brasil e diretora de Clima e Cidade no Instituto de Referência Negra Peregum, Mariana Belmont, não cansa de repetir: “o termo justiça climática é europeu e branco demais para retratar o que vivemos na América Latina”. Para ela, a causa das mortes não são as chuvas e sim a falta de política habitacional destinada à população negra e periférica.

“É a política urbana a responsável pelas pessoas negras e periféricas estarem em condições de subalternidade e de risco socioambiental”, escreveu em sua coluna na Folha de S. Paulo.

Vale lembrar que a expressão justiça climática é usada para descrever a necessidade de equidade na luta contra a crise climática e a mitigação dos efeitos das alterações do clima. No entanto, não podemos ignorar que grande parte do dano climático sofrido pelos países mais pobres é causado diretamente pelos países mais ricos, predominantemente localizados no hemisfério norte do planeta.

Quem concorda com Mariana Belmont é Lara Martins, publicitária e ativista climática, gerente de relacionamento de Empresas B Brasil e delegada de engajamento do G20, que participou de uma live da Alter logo após a COP 26, em 2021.

Lara explicou que o racismo ambiental tem origem na questão histórica de exclusão da população negra e indígena. Não apenas dos espaços de tomada de decisão, mas também dos locais de empoderamento econômico, de educação e de capacitação.

“As pessoas negras, por conta do seu histórico e do contexto, também são excluídas nos lugares de tomada de decisão quando a gente está falando de meio ambiente, de natureza, de crise climática, de sustentabilidade. E a gente deve falar de justiça social quando a gente está falando de crise climática. É uma crise que afeta a todas e todos de forma diferente e as pessoas negras e indígenas, mais vulneráveis e mais pobres, infelizmente não estão fazendo parte da tomada de decisão, apesar de serem as mais afetadas”, conclui.

O financiamento climático é solução?

O financiamento climático foi pauta importante na COP 27, realizada em 2022 no Egito. O objetivo é fazer com que países ricos financiem projetos, assegurando que países mais pobres consigam se adaptar aos impactos da crise climática.

A iniciativa pode até ter boa intenção, mas tá mais para um processo de reparação histórica, convenhamos.

Entender a relação entre desigualdade social, desigualdade racial e crise climática é fundamental. As ações que visam mitigar os efeitos das alterações no clima se baseiam, integralmente, em medidas sustentáveis. Pensar a sociedade, a partir de uma perspectiva atual, é reconhecer que para manter certas desigualdades é necessário que haja o oposto da sustentabilidade. O primeiro passo para equilibrarmos as ações climáticas é garantirmos a equidade de recursos e oportunidades para a ampla população.

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