A mídia vem dedicando espaço para que empresas demonstrem suas boas práticas ESG. Saiba neste artigo como isso pode ser uma oportunidade para a construção de uma reputação positiva para as empresas
Eduardo Nunes, da Equipe Alter
‘Leva-se 20 anos para construir uma boa reputação e apenas 5 minutos para destruí-la. Se você pensar sobre isso, fará as coisas de forma diferente’. A reflexão do megainvestidor americano Warren Buffett ilustra bem a força que a reputação tem para as marcas. Nos dias de hoje, com crescente cobrança de consumidores e investidores para que as empresas adotem critérios ESG (Environmental, Social and Governance) em suas operações, a reputação está cada vez mais associada à atuação por propósito. Em síntese, cada vez mais as marcas são cobradas para que adotem na prática uma postura de respeito a preceitos sociais, ambientais e éticos.
Esse movimento fica evidente quando acompanhamos o fluxo dos investimentos no Brasil e no mundo e o espaço que a mídia destina para a cobertura desse tema. Em junho de 2021, Warren Buffett juntou-se ao também bilionário Bill Gates para investir US$ 1 bilhão em uma nova geração de usina nuclear, na qual os reatores terão impacto zero em emissão de carbono. Não se trata modismo, portanto, quando o 4⁰ (Gates) e o 6⁰ (Buffett) homens mais ricos do mundo direcionam seus investimentos para um projeto de inovação em energia com boas práticas ESG. Trata-se de um negócio com baixo impacto ambiental, associado ao propósito de enfrentamento às mudanças climáticas, que sustenta a construção de uma imagem positiva com reflexos na percepção de consumidores e investidores.
“Acreditamos que a Natrium será um ‘game-changer’ para a indústria da energia”, disse Gates, ao anunciar o projeto. A mensagem do bilionário foi construída a dedo. Como ensinou Paul Holmes, um dos mais respeitados consultores de PR do mundo, marca é promessa. Reputação é resultado da entrega dessa promessa. A Natrium começa a construir a sua reputação a partir de uma mensagem forte e marcante lançada por um porta-voz de peso global. A empresa quer ser uma game-changer da indústria de energia.
Rebranding no setor energético
Globalmente, é possível observar com clareza o redirecionamento gradual de investimentos de empresas do setor de energia para fontes renováveis. Historicamente reconhecidas como vilãs, as petroleiras vêm buscando uma nova posição no mercado, por meio de projetos de rebranding, com a oferta de um portfólio mais amplo, capazes de desenvolver projetos a partir de múltiplas fontes, inclusive limpas. Em 2018, a norueguesa Statoil retirou o ‘oil’ do nome e virou Equinor. Em maio de 2021, foi a vez da francesa Total mudar sua marca. Passou a se chamar TotalEnergies, ampliando o escopo de energia, além do óleo e gás.
Essas empresas sabem que a manutenção da associação das suas marcas somente à exploração de óleo e gás representa um risco para o negócio no médio e longo prazos. Não adotar cuidados sobre a imagem da marca e permitir que ela seja arranhada tem impacto direto na sua reputação. Esse conjunto afasta consumidores e investidores. É ruim para os negócios! Esse movimento de consumidores e investidores em direção à uma agenda mais sustentável tem reflexos diretos no mercado da mídia.
Agenda ESG na mídia brasileira
Em 2012, quando o Brasil sediou a Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável – a Rio+20 – era amplo o espaço de cobertura da mídia brasileira na agenda da sustentabilidade. Essa pauta perdeu fôlego na imprensa nacional a partir de 2014 e só começou a se recuperar em 2019, ganhando relevância e, em muitos casos, protagonismo a partir do primeiro semestre de 2020.
Com a epidemia do coronavírus avançando no país, a EXAME, uma das revistas de maior relevância da América Latina, abriu espaço de destaque no portal EXAME Invest para cobertura do tema. Em 2021, a revista lançou as edições especiais EXAME CEO, voltado para o Novo Capitalismo, e, em maio, os Melhores do ESG. O jornal O Estado de S. Paulo criou o segmento Retomada Verde e a Folha de S. Paulo dedica semanalmente espaço especial para o tema ESG. A Editora Globo criou o projeto editorial patrocinado Um Só Planeta, que reúne 19 marcas de seu portfólio (entre elas, CBN, O Globo, Época Negócios e Valor Econômico) em um site próprio em que propõe ações para enfrentamento à crise climática. Além da cobertura jornalística, esses projetos exploram lives, podcasts e newletters temáticas.
Esses são apenas alguns exemplos mais emblemáticos de espaços nobres que a imprensa nacional abriu para o tema ESG, mas que se replicam em alguma medida com o fortalecimento da mídia especializada – como a estreia do site Capital Reset, e os consolidados Projeto #Colabora e Plurale. Em âmbito global, o efeito é semelhante, com a imprensa americana e de grandes mercados da Europa respondendo à demanda do mercado consumidor e de investidores por mais conteúdo relacionado à temática da sustentabilidade e do ESG.
Alinhamento da comunicação aos ODSs
Do ponto de vista de Comunicação e Marketing, é estratégico monitorar e acompanhar esse movimento para a construção de uma reputação sólida e consistente das marcas. Fundamentalmente, é essencial que a marca tenha um posicionamento de fato alinhado à agenda dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS) das Nações Unidas. Essa é uma condição ‘sine qua non’ para o desdobramento em ações de comunicação e marketing com os diversos públicos de interesse em diferentes canais de mídia online e offline.
A gestão da imagem de um capital reputacional – por meio de campanhas nos ambientes online e offline, interações com o público e posicionamento no mercado – só é possível a partir de uma atuação coerente com o discurso. Só assim para estabelecer uma relação sólida de confiança com os públicos de interesse, tais como colaboradores, clientes, investidores, governos, Poder Judiciário, legisladores, organizações do terceiro setor e sociedade em geral, além da imprensa (em especial, jornalistas de interesse especialistas na cobertura dessa agenda).
Gestão de imagem e greenwashing
No aspecto da prevenção, a gestão eficaz da imagem e a construção do capital reputacional deve prever a adoção de mecanismos de políticas internas e de compliance e a adesão a práticas e acordos setoriais e globais. Em paralelo, é importante prever planos de gestão de crise que visem preservar a confiança dos públicos de interesse na marca, de forma que evite a perda de mercado, de investimentos e de influência sobre a agenda de temas estratégicos para o negócio.
Igualmente relevante é dedicar especial atenção e cuidado para os riscos do chamado greenwashing. Esta é uma armadilha para empresas que posicionam a comunicação e o marketing à frente das ações e seus resultados. Com informação amplamente disponível, consumidores e investidores mais engajados podem checar a coerência do discurso em tempo real. Por isso, é fundamental garantir que toda ação de sustentabilidade comunicada tenha respaldo por meio de dados, imagens, vídeos ou depoimentos de outros públicos de interesse envolvidos. Em resumo, a mensagem precisa estar muito bem alinhada à agenda real da organização.
Nesse contexto, é estratégico manter um plano de comunicação que contemple todos os públicos de interesse e que espelhe o alinhamento entre o discurso e a prática sobre a temática da sustentabilidade e ESG. Há hoje na mídia brasileira mais espaço disponível para que as empresas demonstrem suas boas práticas e apresentem um engajamento espontâneo à agenda dos ODS e aos critérios ESG. Com reputação positiva, ao passar por um momento de crise, a marca poderá utilizar dessas práticas para melhorar sua imagem e reconquistar a confiança de consumidores e do mercado, uma vez que já tem um histórico construído ao longo do tempo.